A televisão é uma caixinha de
surpresas. Ainda não conseguimos pausar um filme, uma novela ou até
mesmo um noticiário instantes antes da exibição de uma cena indesejada.
Sem informação sobre o tipo de programa que estamos assistindo fica
impossível exercer o dever de proteger as crianças de conteúdos que
prejudiquem seu desenvolvimento mental e emocional. Por mais que os pais
saibam que devem conversar com seus filhos quando algum conteúdo
inadequado é exibido, os especialistas alertam sobre a importância de se
evitar este contato.
Se as crianças estão na TV, no
celular, ou em outras telas, é hora de ficar por perto e saber o que
está sendo exibido. A preocupação com os conteúdos que chegam até as
crianças não se resume ao lar mas também a outros espaços em que há uma
TV ligada ou outro equipamento. Restaurantes, salas de espera de
consultórios e até mesmo dentro de aviões, os pais devem ficar atentos.
Aline Lataro de Souza lembra de uma
ocasião em que ela, o marido e o filho pequeno almoçavam em um
restaurante com uma TV sintonizada em um canal que exibia um programa
policialesco. “Nós
pedimos e o gerente mudou de canal”, relata. Para ela, tais programas
só deveriam ser exibidos em horários noturnos. E completa: “na verdade,
tais programas
nem deveriam existir porque este tipo de “jornalismo” serve para
incitar o ódio e dar a sensação de impunidade às pessoas.” Por serem
programas jornalísticos e exibidos ao vivo, eles não entram no sistema
de Classificação Indicativa e podem, infelizmente, ser exibidos em
qualquer horário.
Conteúdo inadequado
Se em restaurantes e lanchonetes, o
controle dos conteúdos exige vigilância, na casa de parentes e amigos
nem sempre é fácil dialogar sobre o tema. Formada em Pedagogia, Patrícia
Rocha Dias conta que tem grande preocupação com o que é exibido também
na casa
dos avós do filho. “Sempre quando viajamos e passamos uns dias lá é
terrível quando meu filho vai até a sala e está passando novela ou algum
programa como os policiais. Eu sempre fico com ele, dou muita atenção,
mas se ele passa pela sala, é inevitável aquela olhadinha”, conta.
Patrícia diz que não consegue
entender o que se passa na cabeça de certos adultos que têm dificuldade
em adequar o ambiente onde tem alguma criança. “Este raciocínio, de que
é a realidade, é o pior porque para tudo tem a idade certa. O
amadurecimento e o discernimento vêm com o tempo. Isso é desprezar a
inocência da infância”, reclama.
A relações públicas Priscila Norcia é mais uma mãe preocupada
com a questão. “Fiquei horrorizada quando soube da possibilidade
da vinculação horária da Classificação Indicativa acabar na TV aberta.
Ainda que meus filhos não assistam, a questão aqui é pensar
principalmente nas classes menos favorecidas, que têm a TV aberta como
principal lazer infantil.” Ela
lembra também dos programas que usam crianças, como Master Chef Junior.
“Apesar da Classificação ser 12 anos, o fato de ter participação
infantil faz com que muitos pais deixem seus filhos assistirem”, observa
Priscila.
Em viagens aéreas, em longos percursos
onde cada passageiro tem uma telinha e inúmeros títulos à disposição,
como controlar que seu filho, que também está no voo, não vai ver o
filme do seu vizinho de cadeira? E algumas famílias relatam também que
já aconteceu, de uma hora para outra, de todas as telas do avião
começarem a passar o mesmo filme que não era adequado para crianças.
E outros pais lembram dos momentos em
passaram na recepção de um consultório com TV aberta, por assinatura ou
mesmo sintonizado em um canal de videoclipes, colocada ali para tornar a
espera mais tranquila. O advogado Daniel Silva reclama das inúmeras
vezes em que se sentiu constrangido pelos conteúdos que presenciou nas
salas de espera na companhia dos filhos. “Precisamos estar mais atentos
ao que pode ser exibido para as crianças”, defende.
TV aberta igual à TV por assinatura
Se por causa da ADI 2404, o Supremo
Tribunal Federal decidir que as emissoras não são obrigadas a respeitar
as faixas horárias, já que não serão mais multadas, a Classificação
Indicativa na TV aberta passará a funcionar como na TV por assinatura.
Hoje, na TV aberta, as emissoras
devem, além de informar as idades não recomendadas, adequar seus
conteúdos à faixa horária. Não é permitido por exemplo exibir um filme
Classificação 16 anos, que pode conter cenas de sexo e de violência, às
15 horas. Este conteúdo deve ser exibido após 21 horas. Na
TV por assinatura, não há a obrigatoriedade da vinculação entre faixa
etária e faixa horária.
Por este motivo, filmes com Classificação 18
anos podem ser exibidos em qualquer horário do dia.
Mas,
afinal, por que existe esta diferença? O que permite a diferença é que a
TV por assinatura disponibiliza às famílias sistemas de bloqueio de
conteúdos baseados em idade ou em canal. Nas configurações da TV por
assinatura é possível bloquear canais, criando uma senha para o acesso
de determinadas emissoras ou conteúdos.
É
importante ressaltar que a TV por assinatura ou as TVs por demanda,
como o Netflix, constituem serviços que são adquiridos pelas famílias. Já
a TV aberta é para todos e por isso a importância de manter a
diferenciação com a vinculação das idades com as faixas horárias.
Durante o dia, grande parte dos pais e mães estão no trabalho enquanto
os filhos estão em casa aos cuidados de pessoas que nem sempre conseguem
fazer este controle adequadamente. Quantos pais e mães estão em casa
durante o dia para acompanhar o que seus filhos assistem quando não
estão na escola? E os adolescentes que ficam em casa sozinhos?
Apesar
do argumento de que é possível para um adolescente, ou até mesmo para
um criança, acessar qualquer tipo de conteúdo pela internet, o cuidado
pelo conteúdo exibido na TV continua valendo para toda a sociedade.
Internet e TV são mídias distintas e sujeitas a regras bem diferentes.
Para a internet fica a questão: como podemos tornar a navegação mais
segura para crianças e adolescentes? Enquanto não conseguimos a resposta
não vamos cruzar os braços. Vamos trabalhar para fazer com que a TV, o
cinema, os jogos eletrônicos e de interpretação continuem informando às
famílias e que a TV aberta tenha as faixas horárias associadas às
faixas de idade, defendem os especialistas e ativistas da infância.
Bloqueio de canais
Os
especialistas alertam que grande parte das famílias desconhece ou não
utiliza o sistema de bloqueio de canais. Ao mudar de canal, do
específico de desenhos infantis, uma criança pode se deparar com cenas
adultas exibidas por outro canal da TV por assinatura. Além do baixo uso
do recurso do bloqueio, há um outro problema nas TVs por assinatura.
Quando se faz o desbloqueio dos canais, porque o objetivo é poder ver um
canal específico que estava bloqueado, todos os demais canais se tornam
desbloqueados.
Há
canais com conteúdo exclusivamente erótico que são bloqueados
automaticamente pelas empresas. Os demais canais, que podem ou não ter
conteúdos inadequados para crianças, precisam ser bloqueados um a um
pelos pais ou responsáveis. Priscila
Norcia lembra que os canais eróticos, mesmo bloqueados, mantêm os nomes
dos filmes visíveis para todos. É preciso então bloquear novamente o
canal, que já está bloqueado pela empresa, para que os nomes dos filmes
não apareçam no guia de programação na tela ou na ferramenta de busca.
“Vamos combinar que alguns nomes são muito inapropriados”, alerta Priscila.
http://rebrinc.com.br
Saiba mais sobre a mobilização pela manutenção da Classificação Indicativa.
Imagem: Campanha MJ
Por: Desirée Ruas/Jornalista Rebrinc
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